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SEM DEFINIÇÃO – Futuro de área onde viveu “Índio do Buraco” em Rondônia é alvo de disputa judicial

Território de 8.070 hectares no Cone Sul de Rondônia é disputado entre indígenas, MPF e proprietários privados
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O espólio de um homem que viveu quase sem nenhum bem material está no centro de uma intensa disputa judicial em Rondônia. Indígenas, o Ministério Público Federal (MPF) e um grupo de proprietários privados aguardam que a Justiça Federal decida o destino de uma extensa área de 8.070 hectares onde, até 2022, vivia um único indivíduo conhecido como Tanaru, ou o “Índio do Buraco”.

Tanaru viveu por pelo menos 26 anos em isolamento voluntário, evitando o contato com outros seres humanos, inclusive outros indígenas que habitam as proximidades. A área que ele ocupava, equivalente a 8 mil campos de futebol, está situada entre os municípios de Chupinguaia, Corumbiara, Parecis e Pimenteiras do Oeste.

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De acordo com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Tanaru era o “único sobrevivente de sua comunidade, de etnia desconhecida”. O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) afirmou que com a morte dele “desapareceu mais uma cultura milenar”.

Em agosto de 2022, indigenistas encontraram Tanaru morto, deitado em uma rede dentro da última das várias palhoças que ele construiu ao longo dos anos. Seu corpo estava preservado e adornado com um colar, chapéu e enfeites de penas, sem ferimentos ou indícios de outra pessoa no local.

Apesar de sua etnia nunca ter sido identificada e ninguém saber ao certo o idioma que ele falava ou sua idade, a Funai o monitorava desde 1996. Tanaru foi apelidado devido ao rio que corta a região e pelo hábito de cavar buracos profundos em suas palhoças. Arredio, ele chegou a flechar um servidor da Funai em 2005, mas aceitava objetos e sementes deixados para ele.

Os restos mortais de Tanaru foram enterrados em novembro de 2022, mais de dois meses após sua morte, após o MPF ingressar com uma ação para que a Funai realizasse o sepultamento no local onde ele foi encontrado. Em dezembro de 2022, o MPF voltou a recorrer à Justiça para transformar o território de Tanaru em uma área pública de proteção socioambiental, uma vez que a Funai nunca realizou os estudos necessários para a demarcação da terra indígena.

A Justiça Federal em Rondônia agendou para julho uma audiência de conciliação sobre o caso. Durante os anos em que monitorou Tanaru, a Funai limitou-se a renovar suas portarias de restrição de uso, interditando o acesso de não indígenas à área.

O procurador da República Daniel Luis Dalberto afirma que “este território já devia ter sido demarcado há muito tempo, e a morte de Tanaru não muda o fato de que essas terras eram ocupadas por indígenas desde tempos imemoriais e, portanto, pertencem à União”. Dalberto e o procurador Leonardo Caberlon pedem que a União e a Funai demarquem a área para decidir, junto com os indígenas do entorno, seu destino mais apropriado.

A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) apoia a iniciativa do MPF e pediu para integrar a ação, fornecendo subsídios à Justiça. A Coiab reforça a necessidade de demarcação da terra, afirmando que a homologação da Terra Indígena Tanaru está em conformidade com a legislação e que o caso lança luz sobre outros casos de genocídio de populações indígenas no país.

Por outro lado, 11 pessoas reivindicam a propriedade da terra na Justiça, afirmando que possuem títulos legítimos dos imóveis. O advogado Sandro Ricardo Salonski Martins, representante do grupo, argumenta que a área não pertence à União e que o falecimento de Tanaru extinguiu o usufruto que ele tinha sobre a terra. Ele destaca que discutir a demarcação de uma área sem população indígena é injustificável.

Gutemberg Ermita Filho, filho de um dos pecuaristas que se estabeleceram na região em 1973, propõe transformar parte da área em um parque arqueológico, mantendo um memorial para Tanaru em um espaço menor. Ele argumenta que a região foi colonizada com incentivo do governo, que ignorou a presença indígena.

A Funai, por sua vez, informou que ainda estuda a correta destinação para a área, lembrando que o STF determinou à União que apresentasse um plano de ação para proteger territórios destinados a povos indígenas isolados. A restrição de uso e ingresso de não indígenas na área foi estabelecida em função da confirmação da presença indígena.

O futuro da área onde viveu Tanaru permanece incerto, aguardando a decisão da Justiça Federal sobre o destino desse território que carrega uma complexa história de resistência e sobrevivência indígena.

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